O ano termina como quem se despede,
num gesto silencioso, quase tímido,
mas o eco de seus passos fica
gravado no chão dos dias que vivi.
A vida adulta é esse abismo estranho
onde somos ao mesmo tempo queda e voo.
Contamos os ganhos, escondemos as perdas,
e no fundo sabemos: somos feitos de falta.
No silêncio da casa, o mundo se amplia.
As coisas falam, como Clarice dizia.
Um prato vazio, a luz pela fresta,
a solidão que me abraça sem pedir licença.
Quem sou eu diante do espelho do tempo?
Quem eu era, quem agora serei?
O balanço é pesado, mas carrego.
Porque viver é isso mesmo: cair, levantar, errar de novo.
O fim de ano traz perguntas sem dono,
e nelas me encontro.
Entre o medo de estar só
e o alívio de me pertencer.
Quero apenas um instante de quietude,
uma pausa entre o ontem e o amanhã,
para sentir que, mesmo imperfeita,
a vida pulsa — como deve pulsar.
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