640 dias e um silêncio


Você passou por mim no meio daquele monte de gente, cerveja e música nas alturas. Mesmo com todas as distrações presentes, como um ímã meus olhos te seguiam. Sedentos por um pedaço seu, cada vez que a gente se aproximava, meu frio no estômago dizia que a minha fome era outra. Sua mão na minha nuca me fazia ter certeza que eu não era a única ali pronta pra perder a cabeça. Perdemos um pouco mais do que isso.

No dia seguinte, já sóbrios, uma sensação aterrorizante tomou conta de mim. Fingi normalidade até você ir embora daqui de casa. No minuto que você bateu a porta eu entendi que aquela era a sensação que eu vinha há algum tempo tentando evitar: sentir algo tão bom e vê-lo sair pela porta. Será que ele volta? Será que isso é real? E você voltou. E foi real.

Foi tão real que nos isolamos na nossa realidade, vivendo de forma intensa e profunda toda a experiência que é conhecer cada pedacinho de alguém. Quando a nossa realidade se chocou com a vida cotidiana o inevitável aconteceu. Duas pessoas, com uma boa bagagem emocional, machucadas, desconfiadas. Você por não querer arriscar ser feliz, eu por medo de ser e perder. Se nossos terapeutas conversassem talvez tivessem nos alertado da cagada iminente.

Fomos embora, buscamos caminhos diferentes, seguimos nossos rumos. E sempre voltamos a nos esbarrar. Talvez seja a nossa química, o seu sorriso, a minha gargalhada, o nosso abraço, o seu ombro que me consola, a minha nuca que encaixa perfeitamente na sua mão, as nossas conversas, ou até os nossos dias desastrosos que viram piada. Não sei. A gente sempre volta.
Mas eu quis fazer diferente dessa vez. Decidi não prolongar mais minha agonia de não te ter e me distanciei.

O silêncio se fez. E é ensurdecedor.

Por Paola Príncipe

Ilustração: Komal Kapoor


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