50%


Uma segunda-feira, cansaço, inferno astral, Netflix e eu em casa assistindo um filme triste sobre um jovem de 27 anos que descobre ter um câncer raro. Não fiquem com pena de mim. Minha segunda seria pior se eu não tivesse tirado essa uma hora e meia para assisti-lo. [Este texto contém spoiler.]

O filme que estou falando é 50% (ou 50/50), cujo título é referente às chances de cura do protagonista. 50% de chances de morrer, 50% de chances de sobreviver. Seria apenas mais um “filme triste” não fosse a ótica dada à obra.

Adam era um jovem roteirista de programas de rádio que morava sozinho, não bebia, não fumava, tinha um melhor amigo fanfarrão (mas gente boa), uma namorada comum (mas sem grande paixão), um pai com Alzheimer e uma mãe superprotetora.

O protagonista se apresenta um cara sério para seus 27 anos, mas ainda cru. O que para um jovem seria um baque, para ele o câncer foi apenas uma má notícia. O garoto abordava a sua doença com uma maturidade incompatível com a sua idade.

Ao longo do tratamento, que incluía algumas sessões de quimioterapia, ele conheceu outros pacientes, com outros tipos de câncer, e sempre mais velhos. Adam também fazia acompanhamento psicológico com uma jovem terapeuta para lidar com a doença, e nesse meio tempo, ele descobre que a sua namorada não era uma pessoa tão bacana assim e coloca um ponto final na relação.

Mesmo com um cenário de tragédia grega instalado, o filme consegue ser leve e trazer boas doses de humor – muitas vezes negro – que foi o que me conquistou.

Num determinado momento, o protagonista se dá conta de que existiam coisas que ele queria fazer em vida, mas ainda não havia feito. Coisas que consideramos “bobas”, como dizer para uma garota que ele a ama, ou terminar seu programa de rádio sobre vulcões.

E por que eu estou contando sobre um filme que talvez você nem tenha interesse?

Bem... Esqueça-se por um momento que o tal Adam tem câncer. O câncer é o elemento dramático do filme, é verdade. Mas o verdadeiro drama ali reside no fato de que a valorização das coisas realmente importantes parecem só ser vistas por conta da doença e da possibilidade próxima de um fim. Quem assiste ao filme, se sente inspirado, vê aquilo como uma lição de vida, mas deixa na teoria. Ou espera para aplicar quando tiver algum tipo de câncer (bate na madeira!) ou doença similar.

A lição nessa história é muito mais simples, acredite, e abrangente do que um drama familiar, amoroso ou pessoal. A valorização de quem se ama, das amizades verdadeiras, do seu projeto de vida e do seu amor próprio não deve vir à tona quando se descobre uma condição que pode te tirar a vida – até porque já dizia nossa vó que “para morrer basta estar vivo”. Mas, sim, todos os dias ao levantar da cama e ver que tem um dia inteiro pela frente para amar a quem se quer bem, lutar pelos seus objetivos, lembrar-se do seu valor, e, correndo o risco de parecer pretensiosa, até mesmo ser feliz.


Todos nós temos, em todos os dias, 50% de chances de ter momentos felizes e 50% de deixar esses momentos passarem. É pegar ou largar.

Publicado originalmente em oxigenada.com

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