Feed incompleto


Mais uma segunda à noite, jantar, netflix, uma fuçada na internet e sempre as mesmas declarações no meu feed. Talvez o problema seja eu e minhas amizades – mais virtuais que reais – mas o fato é que dificilmente alguma coisa me chama atenção de verdade por aquelas bandas do Facebook. Ali, só encontro as irritantes shiny happy people, os engraçadinhos perspicazes de ocasião, as “bonitas” fazendo carão, os indignados compartilhando sua revolta e mais alguns grupos tão clichês quanto os supracitados. É claro que não fico de fora disso. Sou honesta o suficiente pra declarar que também faço parte de uns clichês sociais, mas não é disso que eu queria falar hoje.

Como já disse, poucas vezes me deparei com algo que chamasse minha atenção nas redes sociais e, especificamente, no Facebook. E como que se destaca no meio de tanta gente bonita, feliz, engraçada e/ou indignada? Com honestidade.

Meu cabelereiro – que, obviamente, não terá seu nome aqui revelado – é um cara gente boa, frequenta minha casa há mais de 8 anos, já tem seus 40 e poucos, dois filhos, trabalha pra caramba, é divertido e gay. E incompleto, segundo ele mesmo.

Não me lembrava de ter seu contato no meu Facebook e bastou uma atualização de status para me fazer parar e refletir sobre a plenitude das coisas. Em sua breve declaração, ele se dizia satisfeito com a vida, com seus filhos, com sua família muito amada, ter fé em Deus, mas sentia falta de alguma coisa. Disse se sentir incompleto.

Aquilo me acertou em cheio, desarmada de frases feitas, e de uma sinceridade tamanha que chega a ser obsceno numa rede social tão comumente fútil. Ele, um cara que lida com a mais óbvia das futilidades femininas diariamente, fez a afirmação menos leviana daquela segunda-feira à noite. Afinal, não somos todos incompletos?

Sim, incompletos. Ou vai me dizer que você já conquistou tudo que deseja? Que não há mais nada da vida que te instigue a levantar da cama todos os dias? Seja uma paixão avassaladora, uma amizade incondicional, uma viagem dos sonhos, uma faculdade que foi deixada pra trás, um emprego incrível, um amor de infância ou até mesmo aquele sapato lindo da vitrine. Vai me dizer que não te falta nada?

A falta de certos sentimentos, relações ou até pertences mesmo, nos faz correr atrás daquilo que desejamos. Se nos falta paciência, amor, tempo, dinheiro, trabalho ou diversão, a gente busca. E passa a vida nessa batalha. Tudo isso para nos sentirmos completos.

Nos fizeram acreditar que somos uma metade pronta pra ser encontrada por outra que vai, finalmente, nos completar. Metade da laranja, tampa da panela, e até de chinelo velho já nos denominaram. Mas, acredite: já nascemos inteiros. Completos de fábrica. Mesmo sem a paciência que desejaríamos ter, ou aquele amor de cinema que gostaríamos de viver, somos todos plenos. Pode parecer contraditório, mas o imperfeito, o incompleto, é justamente o que nos torna perfeitos. A plenitude mora dentro da nossa busca diária para não somente existir, mas viver de verdade.

Publicado originalmente em garimppo.com.br

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